02/02/2024
Mulher que denunciou 12 homens por estupro cita proposta de R$ 30 mil pelo silêncio; 11 são PMs
GUARUJÁ, SP - A mulher que denunciou ter sido estuprada por
12 homens, sendo 11 policiais militares, e depois engravidado alega que os
agentes ofereceram de R$ 20 a R$ 30 mil para que ela não levasse o caso às
autoridades. O suposto crime aconteceu em Guarujá, no litoral de São Paulo, em
julho de 2023. Imagens obtidas pelo g1, nesta sexta-feira (2), mostram
conversas dela com um intermediário na 'negociação' dos valores. Segundo a mulher, o estupro ocorreu após ela ser 'dopada' --
ainda com momentos de consciência -- em uma festa em uma uma casa alugada por
um grupo de PMs no bairro Balneário Praia do Pernambuco. Ao g1, ela disse ter
interrompido a gestação por vontade própria após o quarto mês. A PM informou
ter instaurado uma sindicância para apurar a participação de agentes no crime. Ela contou à equipe de reportagem ter sido abordada por um
policial militar no WhatsApp pouco antes de interromper a gravidez. O homem não
está envolvido no suposto crime, mas, por conhecer ambas as partes, agiu como
um 'intermediário' do grupo e apresentou uma proposta para 'comprar o silêncio'
dela. O objetivo dos PMs envolvidos, segundo a mulher, era fazer
com que ela não desse prosseguimento à denúncia à Polícia Civil revelando os
nomes, o que fez em janeiro de 2024. O primeiro boletim de ocorrência do estupro às autoridades
foi registrado em dezembro de 2023, mas sem citar os policiais. Com ele, de
acordo com ela, o objetivo era apenas para conseguir a aprovação para
interromper a gravidez de forma legal em um hospital da capital paulista. Segundo o advogado Allan Kardec Campo Iglesias, que
representa a mulher, ela fingiu a negociação para conseguir mais informações
sobre os autores do crime, uma vez que estava 'dopada' e não lembra de
detalhes. Ao g1, ele acrescentou que a vítima não recebeu qualquer quantia dos
PMs. "Me procuraram para 'deixar isso pra lá', já que a
minha intenção era interromper a gravidez mesmo. Pediram para que eu desse um
número, disse R$ 50 mil. Responderam que estavam todos 'quebrados' e diminuíram
para R$ 30 mil. Acabou ficando em R$ 20 mil", disse ela.
Compra do silêncio Nos dois prints de conversas via WhatsApp, obtidos pelo g1,
é possível ver o que seria a definição do valor entre os policiais, antes de
ser repassado para a mulher, e também a 'negociação' dela com o PM que fez a
'ponte' com os envolvidos (veja acima). Na primeira imagem, duas pessoas iniciam uma conversa com a
sigla 'Q.A.P', que significa "na escuta" no meio policial. Em seguida, uma delas afirma que "todos
aceitaram", mas "fixaram o valor em 20 [mil]", sendo "10 de
cara e os outros 10 quando acabar". A equipe de reportagem apurou que o
"acabar" seria em referência à conclusão do caso, que havia sido
denunciado sem detalhes à Polícia Civil. A segunda imagem mostra uma suposta conversa entre a mulher
e o PM que 'representou' o grupo envolvido. Neste momento, ela teria dito que
"só queria acabar com isso logo" e que o valor de R$ 30 mil seria o
"mínimo depois de tudo". Estupro O crime, segundo a mulher, aconteceu no Balneário Praia do
Pernambuco, em Guarujá (SP), no último dia 12 de julho de 2023. Ela disse ter sido convidada com uma amiga para a festa, que
tinha aproximadamente 20 pessoas, sendo a maioria de homens. A vítima acredita
ter sido "dopada" enquanto ingeria bebidas alcoólicas no local. A mulher acrescentou que, inicialmente, teve relação
consensual com um dos integrantes da festa em um quarto no imóvel. Ela
ressaltou que, após "apagar" no cômodo, os demais se
"organizaram" em fila para estuprá-la. "Me senti usada",
disse ao g1, anteriormente. "Eles fizeram uma 'fila'' e eu conseguia ouvir algumas
coisas. Diziam: 'Vai logo! Deixa que é a minha vez'". A mulher relatou
que, apesar de dopada, conseguia lembrar de algumas cenas do ocorrido. A mulher acabou dormindo na casa alugada para a festa.
Segundo ela, no primeiro contato que fez com a amiga após o ocorrido, a colega
disse não soube nada sobre o estupro, e pensou que as relações tivessem sido
consensuais. Os detalhes sobre o estupro, além do que a mulher se
recorda, foram contados por um amigo que também estava na festa e disse ter
sido o responsável por "interromper" os abusos. Ela, no entanto,
acredita que ele - o único que não faz parte da PM - também participou do ato. Gravidez e polícia A mulher relatou ter descoberto a gravidez apenas em
dezembro do ano passado, já que não menstrua normalmente. Ao g1, ela
acrescentou não ter se relacionado com outras pessoas durante o período. A decisão de interromper a gestação, ainda de acordo com
ela, aconteceu logo em seguida. Para isso, ela teria ido até uma unidade de
saúde em Guarujá e perguntado sobre o procedimento, sendo indicada a fazê-lo na
capital paulista. A vítima disse ter entrado em contato com um hospital - não
informado - em São Paulo, mas ouviu que o procedimento seria feito legalmente
apenas após o registro de um boletim de ocorrência sobre estupro, feito na
sequência por ela na Delegacia de Defesa da Mulher (DDM) na capital. Conforme apurado pelo g1 junto ao advogado dela, o primeiro
registro à Polícia Civil aconteceu de forma "breve" e sem prestar
detalhes sobre os homens que teriam cometido o crime. Segundo ele, a cliente
sentia medo de uma represália e desejava, de imediato, apenas interromper a
gravidez. Segundo a mulher, o contato com o grupo de PMs, feito por
meio de um policial que conhecia as partes e não estava envolvido no crime,
aconteceu logo após o registro da ocorrência. Ele teria enviado mensagens perguntando sobre o BO e, em
seguida, oferecido dinheiro para que ela não seguisse com a denúncia -- ela não
soube informar como ele foi avisado. O registro 'completo' do caso aconteceu apenas em janeiro,
quando a mulher procurou a DDM de Guarujá (SP) e denunciou em detalhes o
estupro à polícia. Neste momento, conforme apurado pelo g1, ela citou os nomes
dos suspeitos. Secretaria de Segurança de SP A Secretaria de Segurança Pública do estado de São Paulo
(SSP-SP) informou, em nota, que a Polícia Civil investiga a denúncia da mulher
como um caso de "estupro de vulnerável". Segundo a SSP-SP, foi requisitado exame sexológico e médico
para a vítima. O caso foi registrado por ela na 1ª Delegacia de Defesa da
Mulher (DDM) da capital paulista e encaminhado para a DDM de Guarujá, que segue
com as investigações. "Diante da gravidade da denúncia, a Polícia Militar
informa que instaurou uma sindicância para apurar a participação de policiais
militares no crime", complementou a SSP.
g1, com fotos: Reprodução
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