14/09/2023
Decretada prisão de pai de santo acusado de importunação sexual de mulheres durante consultas
SÃO PAULO, SP - A Justiça de São Paulo decretou nesta
terça-feira (12) a prisão de um homem que se apresentava como pai de santo em
terreiros de umbanda na Zona Leste. Laércio José de Oliveira é acusado de
importunação sexual contra mulheres durante as consultas espirituais. As
informações são do g1. Ao menos oito mulheres ouvidas pela Polícia Civil
denunciaram os abusos. Pelo menos três vítimas foram ouvidas pelo SP1, da TV
Globo, na condição de anonimato, e narraram os abusos. Laércio ainda não foi preso e está sendo procurado pelos
investigadores. Segundo as vítimas, o pai de santo dizia que as mulheres
precisavam de limpeza espiritual e, para que isso acontecesse, era necessário
que os dois tivessem relações sexuais. “Ele tentou tocar nas minhas genitais, eu não permiti.
Tentou fazer com que eu tocasse na genital dele, eu também não quis. Foi quando
ele começou a se masturbar na minha frente. Ele falava que era necessário para
quebrar o trabalho [que tinham feito contra mim]”, declarou uma das vítimas. “Me senti completamente abalada. Só sabia chorar. No momento
que ele tava fazendo, eu já tava chorando. Assim que ele foi embora, pensei até
em tirar minha vida para ser bem sincera. Porque eu tava muito mal...muito”,
completou a mulher. Ela não foi a única. Ao longo de dois anos, pelo menos mais
sete mulheres denunciaram Laércio por atitudes parecidas. Uma delas é menor de
idade. “No dia que eu fui até o terreiro, a esposa dele não estava
presente e por ser uma pessoa que eu conheci eu confiava, acabei me consultando
com as entidades dele. Foi um momento que ele acabou me levando para um canto
mais afastado, que não tem muita visibilidade, e antes de acontecer, ele
perguntou diversas vezes eu confiava nele. Aí ele colocou a mão dele dentro da
minha blusa”, narrou outra moça. A terceira vítima diz que foi atacada durante uma consulta
em 2020, enquanto ele atuava como médium em outra casa. “Ele enfiou a mão nos meus seios e começou a apertar,
apertar. Fiquei em choque, não sabia o que fazer. Segurei a mão dele e tirei
bruscamente. Ele me puxou pelo braço e falou ‘se você contar para alguém que eu
fiz isso, eu vou falar para todo mundo que você veio aqui para fazer amarração
para o meu ex. Ninguém vai acreditar em você. Você nunca mais vai poder pisar
nessa casa’”, comentou a moça. O que diz a defesa do
acusado Em nota, os advogados de Laércio José de Oliveira - Andreia
Gomes Fonseca e Rafael Breim - disseram que "o réu acompanhou diretamente
toda a investigação criminal, comparecendo de forma espontânea a todos os atos
para os quais foi convocado, inclusive indicou, por sua defesa, testemunhas
para serem ouvidas". Os advogados também refutaram as acusações das vítimas:
"Durante a instrução processual demonstrará de forma cabal sua inocência.
Quanto a decretação da prisão, entende a defesa que não restou devidamente
fundamentada e que buscará junto ao Judiciário sua revogação para que possa
acompanhar o desenrolar do processo em liberdade, tal como lhe garante a
Constituição Federal e a Lei processual brasileira." Quem é Laércio José
de Oliveira? Entre 2020 e 2022, Laércio integrou dois terreiros na Zona
Leste da capital paulista. Em um deles, atuou como médium. Em 2021, o pai de santo abriu a própria casa de umbanda,
onde ainda atuava neste ano. Aos poucos, as vítimas dos dois locais foram tomando
conhecimento dos casos umas das outras. Foi então que elas decidiram se unir e
denunciar. “A gente começou a ver as meninas que se afastaram do
terreiro, que cortaram vínculos e tudo mais e conforme a gente ia descobrindo
outros casos, outras situações, era para tentar fazer alguma coisa assim, que
que impedisse que ele continuasse porque ainda assim tem pessoas que, que
fecham os olhos diante do que aconteceu, tem pessoas que ele ainda consegue
manipular, enfim, de forma psicológica falando que é tudo uma conspiração
contra ele contra a família dele”, declarou uma das vítimas. Prisão decretada Em março deste ano, a Polícia Civil encaminhou os casos ao
Ministério Público de São Paulo, que pediu a prisão preventiva de Laércio,
alegando que “na condição de líder espiritual, ele abusava sexualmente de
vítimas que o procuravam para pedir ajuda". A Justiça acolheu o pedido do MP e decretou a prisão dele. “O modo de agir dele tem um padrão. Isso é muito interessante
de ser observado, né? isso se repete interessante que isso se repete de maneira
quase que em série com todas as vítimas. O que se fala, o que se faz e o
resultado, é quase que sempre o mesmo, né? E colocando as vítimas sempre nessa
posição de aprendizes, de ouvintes ali da palavra do líder. E ele se utiliza
dessa posição. E terminava sempre levando elas para ambientes em que ficavam só
os dois para perpetrar esses crimes sexuais”, declarou o advogado Gabriel
Calze, que representa parte das vítimas. Comunidade condena
ações de Laércio O antropólogo Rodney William é babalorixá e especialista em
religiões de matriz africana. Ele diz que atitudes como a de Laércio são
condenadas pela comunidade da Umbanda e são representam a religião. “As religiões de matrizes africanas são religiões que
reproduzem a família extensa africana, que foi esfacelada com o processo de
escravização. Então, é uma família que via trazer esse sentimento, esse afeto e
apoio que é tão fundamental pra um ser humano se constituir como pessoa. Uma
pessoa não pode ir pra um terreiro - que está voltado pra trazer a paz,
conforto, harmonia, para sua vida espiritual – e ser vítima de abusos dentro do
terreiro”, comentou. As vítimas de Laércio narram que não abandonaram a religião
depois das ações do pai de santo, mas foram buscar ajuda em outros terreiros. “Hoje em dia eu tô em outra casa que eu fui muito bem
acolhida. Na verdade, se não fosse a casa acho que eu não teria aguentado tudo
que eu aguentei”, contou uma das vítimas.
“Eu não consigo esquecer o que ele fala voz ainda fica
grudada na minha mente. Eu tô fazendo tratamento com psicólogo, para tentar me
libertar, desse trauma”, declarou outra mulher. g1, com foto: Reprodução/TV Globo
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