26/05/2023
Juiz Federal condena defensores do kit covid a pagar R$ 55 milhões por danos coletivos à saúde
BRASÍLIA, DF - O juiz Gabriel Menna Barreto von Gehlen, da
5ª Vara Federal Cível do Rio Grande do Sul (JFRS), condenou uma associação de
médicos e duas empresas do ramo da saúde a pagarem um total de R$ 55 milhões em
indenização por terem publicado em jornais um texto em defesa do kit covid,
conjunto de medicamentos que supostamente serviriam como tratamento precoce
para covid-19. Os condenados foram o Grupo José Alves (GJA Participações),
a Vitamedic Farmacêutica, fabricante de medicamentos do kit covid, e a
Associação Dignidade Médica de Pernambuco, que assina um texto chamado
Manifesto pela Vida, publicado em jornais de grande circulação em fevereiro de
2021, durante a pandemia de covid-19. No texto, a associação defende a prescrição de um coquetel
de remédios - entre eles, a ivermectina, cloroquina, hidroxicloroquina - como
meio de prevenir a contaminação por covid-19, numa espécie de tratamento
precoce, que evitaria o desenvolvimento da doença. Durante a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da
Pandemia, contudo, o diretor da Vitamedic assumiu em depoimento que foi a
empresa, e não a associação, que custeou a publicação do manifesto em jornais
de grande circulação, no valor de R$ 717 mil. O relatório final da CPI também constatou que o faturamento
da farmacêutica, fabricante de ivermectina, passou de aproximadamente R$ 16
milhões em 2019 para mais de R$ 474 milhões em 2020 e R$ 265 milhões de janeiro
a maio de 2021. Teor da decisão Para além da ineficácia de tais medicamentos no tratamento
contra covid-19, depois comprovada por estudos científicos, e da ameaça à saúde
pública de quem defendeu o kit covid, o juiz concluiu que houve no caso
propaganda velada e irregular de medicamentos, em violação às regras da Agência
Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Citando o relatório final da CPI da Pandemia, o magistrado
escreveu que “a publicidade promovida pela associação ré - em conluio com
fabricante de ivermectina - incidiu em grave ilicitude sanitária”. Em outro
trecho, o juiz afirmou que, “configurada a interposição de pessoas ilícita,
fica evidenciado que o 'manifesto pela vida' foi mecanismo ilícito de
propaganda de laboratório fabricante de medicamento, servindo a ré do triste papel
de laranja para fins escusos e violadores de valor fundamental, a proteção da
saúde pública”. Ele justificou o valor da indenização por danos morais
coletivos afirmando que “o bem tutelado é o mais fundamental da Constituição,
porque [é] pressuposto para o gozo de todos os demais: a vida e a saúde”. O magistrado acrescentou que “a só e pura
publicidade ilícita de medicamentos, pelos riscos do seu uso irracional, já
representa abalo na saúde pública e sua essencialidade impõe a devida
reparação”. À época dos fatos, a Anvisa insistiu que o Manifesto pela
Vida não feria as regras da agência que disciplinam a propaganda de
medicamentos. Por esse motivo, o Ministério Público Federal no Rio Grande do
Sul (MPF-RS) pedia também que a agência fosse condenada a publicar um alerta à
população sobre os riscos do kit covid. O juiz, contudo, negou o pedido,
considerando que a situação sanitária mudou e que tal retratação resultaria
apenas em nova propaganda dos medicamentos. Ao final, ele multou a Vitamedic e o Grupo José Alves, dono
da farmacêutica, em R$ 45 milhões, e a Associação Dignidade Médica de
Pernambuco em R$ 10 milhões. Cabe recurso à segunda instância da Justiça
Federal. Outro lado Em sua defesa, a Vitamedic alegou que o patrocínio para a
publicação do manifesto não se tratou de propaganda irregular de medicamento,
uma vez que a própria Anvisa havia concluído isso. Somente a agência teria
competência para analisar a regularidade ou não do texto, defendeu a empresa.
A associação, por sua vez, sustentou no processo que
"defende o ‘tratamento precoce' por ser absoluta convicção, dos
profissionais que a compõe, que o referido tratamento minimiza a replicação
viral e melhora a imunomodulação, trazendo benefícios concretos à saúde e
recuperação dos pacientes. Não há nenhum interesse comercial, econômico ou
político, nem tem em seus quadros nenhum expert financiado pela indústria
farmacêutica.” Felipe Pontes/Juliana Andrade – Agência Brasil, com foto: Reprodução/ TV Vanguarda
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