16/03/2023
TCU dá 5 dias para Bolsonaro entregar as joias que deveriam estar no acervo da Presidência
BRASÍLIA, DF - O Tribunal de Contas da União (TCU) estipulou
um prazo de cinco dias úteis para o ex-presidente da República Jair Bolsonaro
devolver à União as joias masculinas que supostamente recebeu de presente do
governo da Arábia Saudita. A decisão, unânime, foi anunciada hoje (15), durante a
reunião plenária da corte. Por sugestão do relator do processo instaurado para
apurar a entrada ilegal das joias no Brasil, ministro Augusto Nardes, Bolsonaro
ou seus representantes deverão entregar o conjunto de joias à Secretaria-Geral
da Presidência da República, anexando ao processo cópia do comprovante da
entrega. O ex-presidente também terá que entregar o fuzil e a pistola que
admitiu ter ganhado de presente de representantes dos Emirados Árabes, em 2019. Em seu voto, Nardes destacou que, como as investigações
ainda estão em andamento, o TCU terá que voltar a analisar a questão em outro
momento para propor uma solução definitiva para o caso. “Novas ocorrências têm sido reportadas diariamente, com diferentes
explicações [por parte] dos envolvidos, razão pela qual é essencial que este
tribunal [aguarde] o resultado das investigações em curso para uma deliberação
segura e definitiva”, acrescentou o ministro, desqualificando o pedido
apresentando pela defesa de Bolsonaro, que, na segunda-feira (13), pediu ao TCU
que recebesse e guardasse as joias masculinas que estão com ele. “Em relação ao pleito do ex-presidente, cabe ressaltar que
esta Casa não tem jurisprudência no sentido de receber joias ou demais objetos
de valor. Por falta de amparo legal, não cabe a este tribunal recebê-las. Até
porque, já há normativas com os procedimentos a serem adotados em caso de
presentes recebidos por autoridades públicas”, observou Nardes. Ao pedir que o TCU recebesse e guardasse os objetos, a
defesa de Bolsonaro tornou público que a caixa contendo um relógio de pulso; um
par de abotoaduras; uma caneta; um anel e uma espécie de terço (uma masbaha)
não declarados à Receita Federal estão, de fato, com o ex-presidente da
República. Inicialmente, Bolsonaro disse que não tinha conhecimento das
joias. Depois, admitiu a jornalistas que os “presentes” foram dados à comitiva
liderada pelo então ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, que viajou
à Arábia Saudita em outubro de 2021, em missão oficial. Bolsonaro chegou a
dizer à emissora CNN que as joias masculinas tinham sido incluídas ao seu acervo
privado, sem deixar claro se, com isso, levou-as consigo ao deixar a
Presidência da República. Em seu pedido ao TCU, a defesa do ex-presidente
acrescentou que o requerimento para que a corte guardasse as joias
"volta-se a deixar consignado que o peticionário [Bolsonaro] em momento
algum pretendeu locupletar-se ou ter para si bens que pudessem, de qualquer
forma, ser havidos como públicos". Nada a declarar Documentos oficiais, imagens gravadas pela Receita Federal e
depoimentos dos próprios envolvidos revelam que o então ministro Bento
Albuquerque e sua comitiva desembarcaram com as joias no Brasil no dia 26 de
outubro de 2021. Além das joias masculinas não declaradas à Receita,
Albuquerque e os dois assessores que viajaram com ele (o ex-chefe da Assessoria
Especial de Relações Internacionais do ministério, Christian Vargas, e o
ex-chefe do escritório de Representações da pasta no Rio de Janeiro, Marcos
André Soeiro) trouxeram ao Brasil um kit de joias femininas avaliadas em cerca
de 3 milhões de euros (aproximadamente R$ 16,5 milhões). De acordo com o ex-ministro, os representantes do governo
brasileiro participaram de uma série de eventos em Riad, na Arábia Saudita,
onde se reuniram com empresários e autoridades públicas sauditas, incluindo o
príncipe regente, Mohammed bin Salman. Ainda segundo Albuquerque, perto do fim
da viagem, seus interlocutores o presentearam com duas caixas que nem ele nem
os dois assessores abriram para conferir o conteúdo. Ao desembarcar no Aeroporto Internacional de Guarulhos, em
São Paulo, Albuquerque e Soeiro informaram à Receita Federal que não tinham
nenhum objeto de valor a declarar. Soeiro, contudo, foi selecionado,
aleatoriamente, para ter sua bagagem inspecionada. Foi então que o agente da
Receita encontrou uma das duas caixas, contendo as valiosas peças femininas (um
colar, um anel, um relógio e um par de brincos de diamantes). As câmeras de segurança do aeroporto registraram a inspeção
da bagagem de Soeiro, bem como o momento em que o então ministro Bento
Albuquerque, alertado de que o assessor tinha sido parado, retorna à área da
alfândega. Recentemente exibido pela TV Globo, o vídeo contém o áudio do
próprio Albuquerque explicando aos servidores da Receita que as joias eram um
presente que “vai entrar lá para a primeira-dama [Michelle Bolsonaro]." Como Soeiro e Albuquerque tinham informado não ter nada a
declarar às autoridades alfandegárias, os agentes da aduana seguiram a lei,
apreendendo as joias femininas, que desde então estão sob a guarda da Receita
Federal. As joias masculinas, no entanto, não foram percebidas e Albuquerque e
seus assessores entraram no país com elas, apesar das orientações dos agentes
alfandegários. De acordo com a Receita, todo viajante que chega ao Brasil
deve declarar bens pessoais cujo valor ultrapasse US$ 1 mil. Já os agentes
públicos devem declarar os bens que não sejam para uso pessoal como
pertencentes ao Estado brasileiro. Conforme a Agência Brasil noticiou, documentos indicam que,
em 29 de novembro de 2022, ou seja, mais de um ano após a comitiva de
Albuquerque trazer as joias ao país, um representante do Ministério de Minas e
Energia entregou o kit masculino ao Gabinete Adjunto de Documentação Histórica,
órgão da Presidência da República responsável por, entre outras ações, analisar
os presentes recebidos por autoridades brasileiras e dizer se são objetos de
uso pessoal ou destinados ao Estado brasileiro em função do valor histórico,
cultural e financeiro. Desde o último dia 7, a Agência Brasil vem pedindo ao
Palácio do Planalto e a pessoas próximas ao ex-presidente Jair Bolsonaro
informações sobre a decisão do gabinete e destinação dada às joias masculinas,
mas ainda não recebeu resposta oficial.
“Não há dúvida de que se trata de presente oficial,
protocolar, destinado ao governo brasileiro. Ou seja, por detrás da
primeira-dama ou do presidente da República está o Estado nacional. Então, não
há sentido em que as joias ofertadas à [ex-] primeira-dama [fiquem] sob a
guarda da Receita Federal. Estas joias, como todos os outros presentes, também
têm que ser entregues à Presidência da República, catalogadas e passar a
integrar o patrimônio público sob a guarda da Presidência”, propôs o ministro
do TCU Walton Alencar Rodrigues durante a sessão desta tarde. Alex Rodrigues/Juliana
Andrade – Agência Brasil, com foto: Isac Nóbrega/PR
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