23/02/2022
STJ adia decisão de julgamento que pode ampliar negativa de cobertura dos planos de saúde
BRASÍLIA, DF - Um novo pedido de vista adiou, mais uma vez,
a decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) sobre a amplitude da cobertura
dos planos de saúde. O tribunal decide se as operadoras devem pagar por
tratamentos que não estejam previstos na lista de cobertura obrigatória
elaborada pela Agência Nacional de Saúde (ANS). Não há prazo definido para que
o tema volte à pauta. O tema tem causado apreensão em grupos de pacientes,
sobretudo os que incluem mães e pais com filhos portadores de doenças raras. Um
dos temores é que uma decisão do STJ favorável aos planos de saúde interrompa
tratamentos já em andamento. Nesta quarta-feira (23), houve manifestação em
frente à sede do tribunal, em Brasília. Após ter sido interrompida em setembro por um pedido de
vista, a análise foi retomada hoje pela Segunda Seção do STJ, composta por dez
ministros e especializada em direito privado. Uma das atribuições do colegiado
é consolidar a jurisprudência sobre assuntos recorrentes que venham recebendo
tratamentos díspares da Justiça. Nesta quarta-feira, contudo, um pedido de vista coletivo
interrompeu mais uma vez o julgamento. Somente a ministra Nancy Andrighi votou
hoje no sentido de que o rol da ANS não esgota os tratamentos e procedimentos
que as operadoras de plano de saúde podem ser obrigadas a cobrir. Ela divergiu do relator do caso, ministro Luís Felipe
Salomão, que em setembro havia votado no sentido de que as operadoras são
obrigadas a cobrir somente o que se encontra na lista da ANS, salvo em casos
excepcionais justificados por pareceres técnico-científicos. Controvérsia A lista de procedimentos e tratamentos obrigatórios da ANS
foi criada em 1998 para estabelecer um mínimo de cobertura que não poderia ser
negada pelos planos de saúde. O rol vem sendo atualizado desde então para
incorporar novas tecnologias e avanços. Desde então, porém, tornou-se comum que usuários de plano de
saúde busquem na Justiça o direito de as operadoras pagarem por procedimentos
ou tratamentos que ainda não estejam previstos no rol da ANS. Entretanto, uma decisão tomada em 2019 pela Quarta Turma do
STJ, composta por cinco ministros, mudou o panorama. Em um caso específico, a
maioria dos ministros considerou que o planos de saúde não estaria obrigado a
pagar por procedimento não previsto na lista da ANS. Tal decisão provocou
controvérsia dentro do próprio tribunal, motivo pelo qual o assunto seguiu para
que a Segunda Seção pacifique a questão. Em termos técnicos, os ministros discutem se o rol de
procedimentos e eventos da ANS tem natureza taxativa, sendo os planos obrigados
a cobrir somente o que está previsto na lista, ou exemplificativa, em que a
lista não esgota as obrigações de cobertura das operadoras. A resolução do tema pode ter grande repercussão por toda a
Justiça brasileira, ante o alto grau de judicialização da saúde no país. Estudo
do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) mostra que, somente em São Paulo, havia
cerca 112 mil demandas judiciais contra planos de saúde em 2017. Há no Brasil
aproximadamente 48 milhões de usuários de plano de saúde. Votos Em setembro, o relator, Luís Felipe Salomão, votou no
sentido de que o rol da ANS tem caráter taxativo. Com isso, as operadoras de
planos de saúde não deveriam ser obrigadas a cobrir tratamentos e procedimentos
não previstos na lista. Para o ministro, somente em casos específicos e
plenamente justificados por pareceres clínicos e técnico-científicos poderia
haver exceções. Salomão entendeu que é preciso dar segurança jurídica e
garantir que a lista da agência tenha, de fato, efetividade. “O rol não existe
por acaso, não está ali para nada, ele está ali para balizar, para servir como
segurança jurídica, para ter um farol”, disse ele nesta quarta-feira. O ministro argumentou que haveria um desequilíbrio nos
contratos de plano de saúde se alguns usuários obtivessem na Justiça direito a
coberturas que outros não têm. Isso afetaria o equilíbrio econômico do sistema
de saúde complementar e aumentaria os custos para todos os usuários, disse o
relator. “O cobertor é que é curto”, afirmou Salomão. “Então temos
que pensar nessa posição de equilíbrio, nessa posição que busca aqui a solução
que melhor atenda a todos os interesses”, acrescentou. Em setembro, ele havia
dito que a questão deveria ser tratada “sem sentimentalismos”. Nesta quarta,
ele chegou a chamar a decisão sobre o tema de “tormentosa”. Abrindo divergência, a ministra Nancy Andrighi votou no
sentido de que o rol da ANS continue sendo considerado pela Justiça como sendo
de natureza exemplificativa, não esgotando as possibilidades de tratamento. Ela
negou qualquer “sentimentalismo” em sua decisão, e disse ter se pautado em
critérios técnicos e jurídicos. Nancy Andrighi negou que considerar o rol da ANS como
taxativo faça com que os planos de saúde se tornem mais baratos e acessíveis,
afirmando que a realidade não demonstra tal efeito. A ministra argumentou
também que, caso o caráter exemplificativo garanta que os casos trazidos à
Justiça sejam todos devidamente analisados, e que mudar isso acarretaria em
restringir o acesso a tratamentos.
“O reconhecimento por esta corte de natureza taxativa do rol
[da ANS] representaria para as instâncias ordinárias orientação jurisprudencial
que desestimula a análise minuciosa e individualizada para todo o
jurisdicionado enquanto paciente em busca de sua cura” disse a ministra. Agência Brasil, com foto: Divulgação/STF
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