31/01/2021
Atraso em vacinação contra a Covid-19 no Brasil deve custar pelo menos R$ 150 bilhões ao PIB em 2021
A lentidão e a desorganização no programa nacional de
vacinação contra a covid-19 vão retirar pelo menos dois pontos porcentuais do
Produto Interno Bruto (PIB) do País em 2021. Segundo cálculos do economista
Bráulio Borges, da consultoria LCA, caso 70% da população recebesse a vacina
até agosto, a economia brasileira cresceria 5,5% neste ano. Se a vacinação
atingir esse patamar apenas em dezembro – hipótese que hoje já é considerada
otimista –, o crescimento do PIB deve ficar entre 3% e 3,5%. Nesse cenário, o
País deixará de movimentar R$ 150 bilhões. Borges também traçou uma hipótese otimista: estimando o
impacto de uma vacinação mais ágil na economia, em um ritmo semelhante ao de
Israel – país mais avançado na imunização contra o novo coronavírus. Nesse
cenário, 70% seriam vacinados até junho, permitindo que as medidas de
distanciamento social fossem relaxadas e garantindo o retorno de atividades em
que há aglomeração. O PIB poderia, nesse caso, avançar 7,5%, um incremento de
R$ 260 bilhões. O crescimento de 3% a 3,5% esperado para a economia no pior
dos cenários (com a maior parte da população vacinada até o fim do ano) pode
parecer positivo, dado que a última vez que o País avançou 3% foi em 2013. Na
prática, porém, significará que a economia passou o ano todo estagnada. Isso
decorre do que os economistas chamam de “carrego estatístico” – quando a base
de comparação é baixa (o resultado médio do PIB em 2020), mas o ponto de
partida é elevado por conta da recuperação ao longo do último semestre do ano. A alta de 3,5% também significará que o País terá, no fim de
2021, um PIB 1% abaixo do registrado em 2019. A economia per capita terá um
resultado ainda mais negativo: 2,5% inferior ao de 2019. “Esses cálculos são um
exercício simplificado que mostra como podemos ter um crescimento econômico se
andarmos mais rápido com a vacinação, o que hoje parece uma realidade bem
distante”, afirma Borges. Por enquanto, a LCA projeta que o PIB ficará nos 3,5% neste
ano. Mas Borges reconhece que talvez a realidade “seja ainda pior que esse
cenário ruim”. A Tendências Consultoria é mais pessimista e estima um PIB
de 2,9%. “Nossa projeção é cautelosa porque já tínhamos uma preocupação com o
quadro pandêmico e não tínhamos a perspectiva de que haveria um movimento de
vacinação afetando parte relevante da população no primeiro semestre. Outra
preocupação é com a situação fiscal”, diz a economista-chefe da consultoria,
Alessandra Ribeiro. Classificação de
risco do Brasil O economista-chefe da Austin Rating, Alex Agostini, afirma
que há inclusive um risco de o Brasil ter sua classificação de risco novamente
rebaixada por causa do atraso na imunização. “Há um risco indireto porque, à
medida que não temos uma vacinação em massa, a confiança dos agentes econômicos
cai. As pessoas também ficam mais em casa e isso afeta um componente que é
analisado para determinar o risco, que é o PIB.” A economista Zeina Latif alerta que a perda de doses de
vacinas, como tem sido verificado em algumas cidades por problemas técnicos, e
a eficácia de 50% da Coronavac, que está sendo produzida no Instituto Butantan,
fazem com que seja mais difícil atingir a imunidade de rebanho. “Esse fator de
incerteza vai pesar em 2021. Ainda vamos passar um bom tempo com limitações
para a atividade econômica. E o setor de serviços é o mais impactado pela
pandemia, além de ser o que tem maior peso no PIB. Acho difícil a gente não ter
decepções com a economia.”
Segundo estimativa do Ministério da Saúde, a vacinação deve
levar “até 12 meses após a fase inicial”. Isso, no entanto, dependerá “do
quantitativo de vacinas disponibilizadas para uso”. A epidemiologista Carla
Domingues, que coordenou o Programa Nacional de Imunizações por oito anos,
lembra, porém, que já houve atrasos no recebimento das primeiras doses de
imunizante e que não é possível ter certeza de que o prazo será cumprido.
“Mesmo quem comprou as vacinas antecipadamente está com problema (para
recebê-las). Imagina quem não comprou. Esse vai para o fim da fila, porque a
demanda mundial é muito grande.” Estadão
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